quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

A última voz do ano

É, muito provavelmente, essa será a última voz que solto por aqui no ano de 2008. Proveitoso ano de 2008.
Eu poderia gritar as conquistas deste ano, os erros, os acertos, os acontecimentos como numa prévia retrospectiva. Talvez, seja isso mesmo, uma voz introspectiva querendo falar sobre o que passou. Porém, o ano ainda não terminou.
Dois pontos foram fundamentais. Duas notinhas, ali, bem pautadas, muito bem encaixadas no pentagrama: o término do mestrado e a aprovação no doutorado.
Provavelmente, no ano que vem, aliás, em janeiro O Ventríloquo faz exatos um ano nas ondas sonoras das palavras, falarei sobre como foi o processo seletivo para o doutorado.
Mas hoje deixo por aqui o gosto bom de um presente de natal. O dar e o receber. Não, não foram as conquistas acadêmicas meus maiores presentes, mas uma vitrola Philips 503 (Mono) que ganhei de Ana.
Concordo que o som dos Cd’s são melhores, encorpados, etc e tal, mas ouvir Chico Buarque na vitrolinha, ouvir um chiadinho inicial é indescritível. Ok, eu também tenho o Box com os três primeiros discos da carreira do Chico relançados em Cd, mas pegar o primeiro disco do cara, aquela capa grande, pôr na vitrola e pensar que você está em 1966...
Nessa leva toda, acabei comprando um ótimo Cd de choro: Pinxinguinha + Benedito – Mário Sève + David Ganc. Ótimo trabalho de releitura dos grandes choros dos mestres!
Fica aqui o prenúncio de um ano bom, de um próximo ano bom. Pois é, não falei muito hoje, não foi crônica, não foi reflexão, não foi pensamento, acho que nem voz. Mas é o que é. Eu juro que pensava, semanas atrás, em conversar sobre minhas impressões acerca do natal, que não se modificaram muito, mas esse ano o amor pesou forte, pesou muito.
Paz a todos e fica o agradecimento aos que dialogaram de alguma forma comigo, citaria nomes aqui, inúmeros nomes. Feliz natal!

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Há dignidade no morrer?

Hoje acordei com duas notícias. Não vieram, necessariamente, ao mesmo tempo. A primeira me pegou sonolento, tanto que voltei aos embalos do sono. O segundo acordar se deu com o toque do celular e a notícia de que eu havia sido considerado apto no exame de língua estrangeira e que minha entrevista para o doutorado ocorrerá amanhã. Fixemo-nos na primeira notícia.
No episódio piloto da série televisiva americana House M.D. há um diálogo entre o médico ranzinza e uma paciente, no qual, após ele ouvir da moribunda que a mesma queria morrer “com dignidade”, House afirma que não há dignidade na morte (...).
A primeira notícia da manhã, dada por minha mãe, era de que sua avó paterna (conseqüentemente, minha bisavó) de noventa e poucos anos havia falecido. Como falei anteriormente, não por insensibilidade, voltei a dormir e, confesso, até esqueci a notícia, confesso, também, que, nesse exato momento, enquanto solto essa voz por aqui, meus pais se preparam para ir ao sepultamento. Não, não vou. Um dia conversaremos sobre meu problema com cemitérios e velórios, na verdade, mais com velórios que com cemitérios. Ao som do ótimo Cd Surpreendente Graça, do cantor e compositor Jorge Camargo, continuemos nosso papo.
Quando me levantei definitivamente, lá por volta das onze da manhã, fui ao quarto da minha mãe contar a notícia da aprovação no exame de proficiência. Só então me lembrei da morte da bisa. Matriarca da família Gonçalves.
Pelo que me recorde, minha bisavó já enterrou dois filhos (incluindo o grande e fantástico Altamiro Gonçalves, meu avô, o cara que me levava para tomar Malzibier), um neto e acho que já tinha até trisnetos. Era Batista convicta. Uma peça rara. Mulher forte de cabelos brancos e longos. Gostava de contar histórias e eu de ouvi-las. Até os treze, quatorze anos, ainda ia muito à sua casa. Uma das minhas melhores receitas de molho, aprendi vendo-a fazer.
Mas, enfim, há dignidade no morrer? Conversando sobre isso com minha mãe, cujo nome na certidão de nascimento é uma singela homenagem à sua avó Isabel, que carinhosamente era chamada de “Vovó Belinha”. Sim. No seu caso houve.
Minha tia a acompanhou em seu leito de morte. Leito rápido que nem sequer chegou a esquentar muito. Morreu conversando. Aos poucos e, ao que parece, sem dor.
Segundo minha mãe, através da narrativa de sua irmã, Vó Belinha conversou, aos poucos disse que estava se sentindo sonolenta, conseqüentemente, sua pressão foi baixando, o sono chegando... o sono eterno.
Não. Há muito não vou a Igreja. Sim. Ainda me sinto Batista, aquele “batistão”, bem tradicional. Porém, não me sinto intolerante, talvez, sarcástico, mas nisso sou com tudo da vida, inclusive na morte. Segundo um grande amigo meu que perdeu seu pai recentemente, os dois umbandistas, morrer dormindo significa que a vida da pessoa foi boa, que a pessoa foi um ser bom, pois, no sono que se converte em morte, ao que parece, para essa religião e, ainda, segundo ele, no Espiritismo, afirma esse postulado e muitos dizem, acho que todos, que não há muita dor (ou quase nenhuma) na morte do sono. Não tenho certeza nesse último caso. Não sei se ao dormitarmos e, conseqüentemente, morrermos, não sentiremos um fio sequer de dor.
Por fim, minha mãe, que já viu muita gente “boa” e “ruim” morrer, discordou (e muita gente o faz, claro) do famoso personagem de Hugh Laurie, existem mortes bonitas e dignas.
No mais, eu realmente até poderia ir ao velório e acompanhar o enterro, pois, acredito, que será uma cerimônia bonita e pelo contexto da morte, pelo tempo que ela viveu, é até um alento o fenômeno incontestável que é o ato de morrer. Não creio que pessoas agarrarão o caixão, pedirão para ela se levantar, em suma, não acho que ocorram manifestações desesperadoras dos que ficaram nesse mundo louco e corrido, cujo tempo não nos dá a mínima dignidade...


Ps. Sim. A foto postada é minha e se chama Isolada, faz parte de um conjunto de fotografias que intitulei de Experimento com luzes.

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Uma única voz

(É uma tessitura da voz anterior) Confesso que sou daqueles tipos, poucos, de torcedores que não são apaixonados pela balbúrdia. Explico-me.
Amo, amo mesmo, o espetáculo que é o futebol, mas admito que minha vida não gira nem um pouco, nem o mínimo do meu tempo, a isso. Não vou a todos os jogos do meu time de coração e nem sempre o assisto na tevê. Porém, sou obrigado a explicitar que das muitas sensações em conjunto que um ser humano, um ator social, pode ter, é no estádio de futebol (e imagino que isso se estenda a outros esportes que suscitam paixão) que ele encontrará a “dança dos deuses”.
Milhares de pessoas entoando os mesmos cânticos arcaicos, cuja prosódia musical é desrespeitada constantemente, hinos eufóricos, quase um tipo de mantra... enfim, uma única voz. Definitivamente, uma única voz.
Algumas torcidas são mais exaltadas que as outras. Violentas. Comportadas. Quase apáticas. A torcida do meu time de coração é um tanto criticada por sua atitude quase “Suíça” no Maracanã. Admito que tem seu fundamento se a compararmos com as outras quase tribais. No entanto, também devo, e aqui não estou puxando a sardinha para as belas três cores de minha camisa, que mesmo “comportados” o espetáculo de cores que fazemos é digno de nota.
Afirmo isso pelo olhar compenetrado de alguém que teve a oportunidade de assistir jogos históricos, tirando o tradicional Fla X Flu que devo admitir não ter até hoje ido assistir por receio, medo do comportamento da torcida rival.
Mas minha voz de hoje que, como salientado no início, é uma tessitura do que sussurrei na segunda-feira por aqui n’O Ventríloquo, pretende estabelecer uma ponte entre este, que é considerado o maior espetáculo da Terra, e o limite do amor pelas cores de uma camisa, de um brasão, de um clube de futebol.
Minha voz é verdadeira, não há falsetes hoje por aqui, nem falo em tons difíceis, nada atonal...
Meus caros, entendo o sentimento dos muitos vascaínos que vi chorar na segunda-feira e ouvi na rádio no domingo. Realmente entendo. Compreendo, pois vi, ainda na adolescência, época essa conturbada para ter seu time rebaixado, duas vezes por sinal, o Fluminense ir para a segunda divisão do Campeonato Brasileiro. Na verdade, ele foi uma e desceu ainda mais um degrau. Parafraseando o, também, tricolor Chico Buarque (na melodia de Tom Jobim): “Meninos, eu vi...” e foi triste, muito triste.
As gozações, as piadinhas de mau gosto. Tudo que sabemos pertencer ao conturbado mundo futebolês. Sim, e,como eu disse, meu time foi rebaixado para a terceira divisão e de lá saiu convidado a voltar para a primeira e esse ano de 2008 quase caiu novamente, porém, no final das contas, reservou-se ao Vasco da Gama a fama de rebaixado.
Uns culpam o Flamengo (?), outros a história do próprio Vasco nos últimos anos de gestão do Sr. Eurico Miranda que, na minha ingênua opinião, mesmo com todos os defeitos, sempre correu atrás dos interesses cruzmaltinos (e dos seus, lógico!). Há outros que culpam o Renato Gaúcho, muitos o Edmundo, até o maqueiro, o massagista, o roupeiro, enfim, todo mundo anda sendo culpado. O que é fato: a situação era crítica e mesmo vencendo o jogo contra o Vitória só mesmo o “sobrenatural de Almeida” (e não sei se ele age fora do Maracanã) para que o time da Colina não caísse!
Não tenho muitos amigos vascaínos, poucos mesmo, posso contar nos dedos da mão esquerda, os que tenho certeza que são: Fernando Gralha, Kimon Speciale, Paulo Duarte, Rodrigo Carvalho, Fábio Oneas e Vinicius Constant. Meu sogro também é vascaíno, mas quase não assiste futebol, nem sei se ligou muito para a nova situação do seu clube, nem sei se onde ele mora o jogo foi transmitido!
Não. O objetivo da voz desse aqui hoje não é fazer piadinha com o fracasso alheio. Tampouco reproduzir as piadas que já rodam pelos bares da vida. De todos, os mais felizes são os flamenguistas, claro. A rivalidade Vasco X Flamengo chega a ser estapafúrdia e, como eu disse, sou um dos poucos torcedores na face da Terra que não aprecia o tumulto que se gera após vitórias e derrotas. Talvez, minha natureza nem um pouco competitiva (para algumas coisas) me vacinou contra as discussões sobre quem é melhor dentro das quatro linhas do campo.
Mas a imagem que mais me chocou foi o individuo suicida que tem figurado os meios de comunicação. Vai entender? Psiquiatras tentam explicar. Sociólogos e até historiadores! Contudo, realmente, me senti compadecido com as criancinhas e os adolescentes chorando nas grades de São Januário. Assustei-me no caminho de volta do Maracanã com meu pai e minha namorada quando, na Avenida Brasil, na altura do bairro de São Cristóvão, vi inúmeros PM’s armados contendo a multidão que até parecia conformada e sem muito alardeio ofensivo.
Compadeci-me, pois passei por isso um dia. Passei por isso num momento cuja tentativa de afirmação, identidade, etc e tal, estava no auge de minha vida: a adolescência e foi uma titica só! É duro torcer pelo time rebaixado, ninguém te escolhe na pelada, todo mundo te azucrina, coisas normais... Mesmo assim, me recordo de ir todo prosa com meu pai ao Maracanã assistir o Fluminense contra times que eu nem sabia que existiam.
O engraçado disso tudo, e agora serei bem particular, voltando a sussurrar, que a conversinha que tivemos tem muito haver com um ótimo livro que ganhei em conjunto de dois professores que tive na faculdade e que se converteram em amigos: “A Dança dos Deuses: Futebol, Sociedade, Cultura” do medievalista (!) Hilário Franco Jr.
O livro é ótimo e iniciei sua leitura recentemente como prêmio de descanso pelo fim do mestrado. Porém, o que mais me chamou atenção foi a última frase da dedicatória do Marcus: “Lembre-se que a vida não é só Idade Média”.
É, acho que a conversa de hoje prova que levei à risca o conselho do mestre... E, amigos vascaínos, paciência, paciência, pois pelo que fiquei sabendo o Vasco da Gama é o único time de futebol do Rio de Janeiro e não tenho certeza se do Brasil também, que entrou no Campeonato Brasileiro pelas vias competitivas, ou seja, antes de jogar a primeira divisão, jogaram a segunda, sendo assim: é o renascimento!

Boa sorte.


Ps. Para aqueles que se interessaram pelo livro do historiador Hilário Franco Jr. segue a citação:
FRANCO JR., Hilário. A Dança dos Deuses: Futebol, Sociedade, Cultura. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.
É um ótimo livro, tanto para leigos como para historiadores. E como meu amigo afirmou, para alguns “especialistas” que cerram seus olhos apenas para um tipo de leitura, pela atitude do autor, se demonstra que é possível ler outras coisas. Claro, não vou comentar minha opinião formal sobre os motivos da publicação. Seria uma herança “Legoffiana”? Uma coisa é certa, pelo menos é uma boa lembrança, já que não se trata de um livro de História Medieval!

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Um domingo com meu pai

Uma das pessoas que mais me orgulho em ter como amigo é meu pai. Ontem tivemos a oportunidade de estar lado a lado como pai e filho, num hábito bem pai e filho: ir ao Maracanã.
Sabe aquele dia que você se dá conta que deve sair um pouco, ver o dia? Pois é, acho que meu pai pensou assim. E fomos eu, ele, Ana e o grande Thiago Porto ao “templo sagrado do futebol”, futuro palco da final da Copa do Mundo de 2014 (?) – a Suderj sempre informa, mas eu nunca sei!
Bem, conseguir reunir um grande amigo, seu pai e a mulher que você ama para assistir teu time de coração é inigualável, realmente, o é. E foi.
Não tenho muito para falar hoje, na verdade, apenas sussurrei... No fundo, acho que foi o texto do meu chapa Marcelo Fernandes (http://mfpmarcelo.wordpress.com/) que me deu esse fôlego de soltar a voz no dia de hoje!
Estou bem, ando feliz. E voltar para casa com meu pai, só nós dois, no longo congestionamento da Avenida Suburbana ouvindo a Rádio CBN marcou o meu ótimo e tranqüilo fim de semana!
Só poço agradecer a Deus...

Obrigado.

Ps. Estou meio ocupado agora para, junto com minha voz, postar uma foto com meu coroa... então, fica para próxima! Pois ainda terão muitas!

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

O fim de um ciclo

A voz de hoje vem num tom manso e sem a rouquidão costumeira. Solto a voz já de madrugada, não tão tarde, mas já é quinta-feira e como de hábito, minha voz de hoje, na verdade, fala do passado, um passado recente, é claro, mas que é passado.
No dia 03 de dezembro de 2008 me tornei mestre em História Comparada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Juro que não imaginava que no ato de minha defesa eu estaria tão calmo, sereno, tranqüilo, o jargão me lembra uma antiga música do Grupo Logos, conjunto musical protestante que fez muito sucesso no seio das Igrejas Evangélicas “tradicionais” nos anos 80 e 90.
Era assim que eu estava. Respondi cada questionamento buscando as nuances da pesquisa, fui elogiado, houve diálogo. Houve o que sempre busquei na minha vida acadêmica uma troca coesa, independentemente se os pressupostos teóricos fossem discordantes da banca. E como a mesma banca afirmou, a pesquisa teoricamente estava bem “amarrada”.
Penso agora num passado mais distante, quase esquecido. Não naturalizarei minha trajetória, pois já quis ser muita coisa na vida: goleiro de futebol, cirurgião, cientista, açougueiro, piloto de avião, arqueólogo (no estilo Indiana Jones), músico, sociólogo e físico. Depois de muito sonhar e ainda sou novo, acabei optando pela carreira de professor, de professor de História e nesse trajeto, com uns meses de curso universitário passei a sonhar em ser pesquisador, mais especificamente, medievalista. O sonho passou a ser o mestrado. Eu tinha que fazer um mestrado.
Ressalto que não quero balbuciar jargões como “sou brasileiro e não desisto nunca...”, pensei em desistir várias e várias vezes, ainda hoje o penso. Mas prossigo, prossigo pois cheguei a feliz conclusão de que, realmente, não sei fazer outra coisa. Que independentemente de salário, status ou coisa assim, é fazendo o que faço que me sinto realizado e hoje ou ontem me senti assim.
Foi bom ver e rever rostos conhecidos. Pessoas com quem contei. Senti falta de outras, que continuo contando para minha felicidade, outras não mais. Foi possível contar nos dedos quem estava lá, o que me remete a uma alegria infinitamente grande. Sei que incontáveis foram as pessoas que estavam naquele momento, em algum momento seu, pensando em mim. Talvez, foram esses pensamentos que me tranqüilizaram e agora que relembro, me surpreendo.
Como disse, não quis falar sobre uma naturalização da minha carreira. Eu seria muito feliz sendo açougueiro. Mas não sou. Mas ainda tenho um pequeno sonho de ter um açougue. E não riam, pois é sério!
Porém, prefiro recortar fontes medievais. Uma alcatra do Poema de Mio Cid. Um contra-filé da Vida de Santo Domingo de Silos.
O garotinho da foto quis ser muita coisa, mas ele confessa que nunca pensou que seria mestre em algo, talvez mestre cuca, mas mestre em História... Jamais!
Fica meu terno agradecimento à minha orientadora, pela confiança antes de tudo e a todos que acreditaram em algum momento, me fazendo, também, acreditar!
E este é apenas o fim de um ciclo...


Ps. Escrevo no calor do momento. Não rolou revisão na voz de hoje, então...

domingo, 30 de novembro de 2008

Os filhos crescem e nós encolhemos

Lembro-me quando prestei vestibular para Sociologia na Universidade do Estado do Rio de Janeiro, a quase sempre grevista UERJ. Essa lembrança, não tão recente, me veio à cabeça agora justamente graças ao título que escolhi para a voz de hoje.
Era o primeiro ano de um novo “conceito” de prova, uma coisa meio interdisciplinar, as disciplinas eram divididas por temas, não me recordo bem, mas acho que era algo como Ciências da Natureza... sei lá, tinham blocos temáticos, ou seja, numa questão que seria classificada só como de História, na verdade, abordava esta disciplina mais Geografia, etc. Isso foi em 2000, se alguém fez esse vestibular me ajude.
O que isso tudo tem haver? Muito. Numa das questões, não cobrem muito da minha memória, falava sobre como o ser humano vai diminuindo com o passar dos anos, diminuindo fisicamente, questões ósseas, de músculos, etc. Vamos à voz de hoje, enfim...
Sempre me questiono sobre o que é ter um filho ou uma filha. Um ser humano que é formado a partir de você e de outra pessoa, que pode ter traços físicos que são de vocês, traços marcantes, como nariz, cor dos olhos, cabelos, pele, mas que não é você! Sério! Sempre me pergunto sobre como deve ser essa sensação de ter um pequeno ser que pensa, sente, se emociona, nos meus braços e hoje me peguei questionando uma outra sensação que vem com essa que acabo de descrever. Uma sensação que vêm muitos anos depois: a de ver os filhos crescerem!
Como sempre, e faço isso desde pequeno, fui questionar minha mãe. Passamos então a conversar sobre esse assunto que com o passar do tempo parece agradar muito os pais.
Minha mãe então deu a narrar como eu era calmo quando criança, os perigos que passei no sítio que morávamos: caí num lago que havia no quintal quando tinha apenas um ano de idade, só me salvei graças ao espírito heróico da maternidade, há também a história do lagarto que caiu do telhado em cima do meu berço e que só não me atacou graças ao mosqueteiro (acho que todos sabem o que é um mosqueteiro, não?), enfim, inúmeras histórias...
Como sou filho único meus pais dedicaram grande parte de suas vidas à minha. Não de uma forma exorbitante, não de uma forma que ajudassem um ser humano egoísta, mimado, a crescer, mas, creio, na medida do possível, uma boa pessoa. Sinto agora que meus pais me vendo defender um mestrado, prestes a tentar o doutorado, não sei, mas tenho a impressão que eles ficam relembrando o pequeno bebê que tinham em mãos e com isso se sentem pequeninos. E era sobre essa sensação que queria que minha mãe falasse.
Lógico que não cheguei ao meu objetivo, acho que assim com ocorre com as vozes que solto por aqui n’O Ventríloquo... Assim como os sons que deixo aqui são sem objetivos, muitas vezes longos e enrolados, sem a preocupação crônística de ter um enredo amarrado, assim foi minha conversa com minha progenitora. Mas no fim, foi mais uma de muitas conversas agradáveis sobre história e memória com ela.
Por fim, e estou encerrando por aqui, ela me contou a história do sapo. Já morávamos nessa mesma casa, também com quintal espaçoso e arborizado, e aqui em dias de chuva fina ou tempo úmido surgem os sapos e rãs. Meu pai sempre, pelo menos que eu me lembre, foi gordinho, barrigudo, assim, meus tios, irmãos de minha mãe, o chamavam de sapo...
Um dia apareceu um sapo aqui na frente da varanda, segundo minha mãe, eu tinha uns dois ou três anos. Brincadeira para cá, brincadeira para lá... todos rindo e eu também: “Olha seu pai, Bruno! Seu pai virou um sapo...” e eu ria. Porém, quando a diversão enjoou, sim, hoje como adulto percebo que chega uma hora que enjoamos de brincar, resolveram enxotar o sapo ou mesmo matá-lo, aí entra a falta de inocência que as crianças não têm, pois é muito mais divertido matar um sapo que ficar rindo com uma criança de dois anos que aquele animal inofensivo é seu pai...
Aí entra a graça da narrativa. Segundo minha mãe, quando a vi com meus tios tacando coisas no anfíbio, tentando enxotá-lo, dei a chorar, chorar forte e berrava e berrava: “Não matem papai, não matem papai...”.
No fim da história, sentada no braço do sofá da sala, assim de forma tão brusca como a forma como estou me calando aqui, ela parou e refletiu: “é o tempo passa...”. Acho que só seu silêncio já me transmitiu um pouco de como é a tal sensação.
E, sim, os filhos crescem e nós encolhemos. E quem protegíamos, agora nos protegem... mesmo que sejamos meros sapos!
Ah, o garotinho da foto sou eu...

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Sobre o poema que não tenho cópia

O ano vai chegando ao fim e é comum arrumarmos as pendências. É a busca pelo perdão, o reatar com amizades longínquas, a perspectiva de um novo projeto, é a construção de novos projetos. Fim de ano é assim e estamos quase no fim do ano.
Nas ruas já é possível sentir o cheiro dos panetones. Nas lojas, além das pessoas já se acotovelarem, já somos massacrados com os jingles natalinos: “Já é natal na...”. Enfim, não há como fugir das referências ao dia 25 de dezembro.
Confesso, e acho que já vociferei sobre isso por aqui, não sou, há muito, chegado às festas natalinas. Há muito tempo que esse dia já não tem um sentido lógico na minha existência e olha que não sou alguém muito lógico.
É curioso como sempre passo o natal sozinho. Não, não é nenhum charminho para receber convites, pois nem sempre estar sozinho significa estar só. Não me lembro muito bem, mas acho que no natal passado fui dormir cedo, meus pais também. No retrasado, peguei o carro e fiquei andando sem rumo por Mesquita, Nilópolis e Nova Iguaçu. Tempos atrás, ia à casa do meu amigo Elber filar uma rabanada banhada no vinho e desejar-lhe feliz aniversário. Ou então assistia cantatas sobre o menino Jesus na Igreja. Tempos idos. Tempos outros.
Apesar de muita gente achar que sou pessoa de muitos amigos, enumero aqueles com quem tenho o hábito de falar no natal, por telefone, claro: Marcus, Fernando, Kátia (às vezes por mensagem via celular), Rodrigo Otávio, Thiago Porto, Celsinho... Não conto Gustavo, pois o vejo e acho que ele compartilha do isolamento nesse dia também.
De quando em quando aparecem amigos novos. Creio que neste ano que já está indo embora, fortaleci alguns laços, conheci gente nova e me afeiçoei. Poderia listar aqui, mas acho que pega mal, pela pouca quantidade.
Curioso como fiz pouca poesia, conseqüentemente, poucas amizades. Muitos que eu pensava serem amigos foram embora e consigo levaram alguns poemas.
Como ando com um certo tempo livre atualmente, dei a fuçar agora pouco em poemas antigos guardados no HD, como tirei esse mesmo dia de hoje (de ontem, na verdade) para organizar minha documentação para a inscrição para prova de doutorado, aproveitei para procurar os manuscritos poéticos dos textos que agora jazem em formato Microsoft Word.
Pouco encontrei. Mas o poema que se segue, sei que nunca guardei, nunca mesmo, o manuscrito. Realmente não fiz cópia. Lembro, vagamente, estar um pouco além da conta alcoólica quando o fiz, não sei com quem ficou, mas tenho a ligeira impressão de que já foi reciclado.
Não lembro onde estava no dia, mas levando em consideração que dia 17 de janeiro de 2007 (quando escrevi o poema) foi uma quarta-feira, provavelmente, eu estava em casa, na rua passeando com Ana ou bebendo em algum bar. Estaria com ela o manuscrito? Não sei. Joguei no lixo? Desfez-se na Baía de Guanabara? Ficou com algum amigo bêbado? Sei lá!
Fica um ar de eterno, e como é bom esse tal de eterno...


Sobre o poema que não tenho cópia


Há uma poesia que eu não lembro o nome
Que eu não lembro muito bem os versos
Só sei que num papel amarelo
Só sei que escrevi no apreço
Ainda sei o tema que ainda hoje mantenho em segredo
Não sei que segredo há naqueles versos
Mas vai e vem me lembro deles
É o único poema que não tenho cópia
É o único poema que não tenho toque
Talvez seja um poema de uma só estrofe
Aquele poema que não sei o nome.

17 de janeiro de 2007
Bruno Alvaro

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

domingo, 23 de novembro de 2008

“Feliz Natal”. O filme de Selton Mello é um soco no estômago dos mais sensíveis


É aquela coisa, depois de muito trabalho, dissertação concluída, projeto de doutorado, você resolve descansar um pouco, não é verdade? Pois é... Decidimos ir ao cinema. Tardezinha chuvosa, friozinho, sala de cinema vazia, nada melhor!

O filme? Putz, vamos assistir à estréia do Selton Mello como diretor? Tá certo, tá certo, o cara já dirigiu uns clipes do Ira!, do Nasi em carreira solo, enfim, por ser bom ator a gente vai com uma “certa” esperança...

Assim, entramos para assistir Feliz Natal... Como o título do post diz: é um soco no estômago! Um certeiro soco no estômago. A história de Caio, que não sei se poderíamos chamar de protagonista, se confunde com muitas histórias de vida por aí, altos e baixos, uma certa vitória, blá, blá, blá. Pelo incrível que pareça, o filme é sobre família, sim, uma família desmoronada, não sei se por conta do que Caio fez um dia ou por fatores que quando não há base familiar permitem que o barco afunde.

A forma como foi construída a filmagem, magnífica! Te põe, literalmente, dentro do filme, dentro das imagens, fortes por sinal. Sim, é um filme cult. E entenda cult no termo mais profundo. Sim, precisa ser, no mínimo um pouco sensível, inteligente, para, no fim das contas, tirar algo no final, não por ser “cult” ou ter “um roteiro complicado” mas pelo próprio ser forte, muito forte por sinal.
Não, não é um filme para o que eu pretendia hoje, nem um pouco, eu deveria ter ido assistir um sucesso de bilheteria logo na estréia, enfrentar fila pro ingresso, pra pipoca, ficar ouvindo gritinhos, etc, enfim... Mas, não sei se por gostar do Leonardo Medeiros (o cara que interpreta o Caio, para quem não sabe quem é, o cara é o protagonista do ótimo filme Cabra Cega, ainda não sabe? Ok, ok, tá na novela das oito da Globo, é o prefeito corno...). É um ótimo ator. Sim, meio marcado por personagens, digamos, atordoados, cansados, mas, acredito eu, a carga dramática do Leonardo Medeiros é fantástica, é um dos grandes atores brasileiros da atualidade. Lógico que não posso ignorar a ótima atuação do filho do inesquecível Gianfrancesco Guarnieri... Paulo Guarnieri.

No fim das contas, a soma de tudo, direção, fotografia, arte, elenco e uma única música como tema (maravilhosamente composta por Plínio Profeta) dá a esse filme ares de “preciso ter na minha coleção”, o melhor de tudo (para mim, claro) é que, certamente, quando sair em DVD, será um dos muitos filmes esquecidos e que são vendidos por R$ 9,00, no máximo R$ 14,99 nas Lojas Americanas! Bom para mim, que ando sem dinheiro, ruim para a arte que deveria ser mais respeitada, mas não entremos nesse assunto!

O personagem Bruno, o menino bonitinho, na trama, sobrinho caçula de Caio, é o contraponto da inocência, da pureza... no fim das contas, tudo é muito cru. Tudo no filme é um soco no estômago.

Poderia falar de cada personagem, para que minha sinopse tivesse cara de sinopse, mas não faço aqui algum tipo de resumo, porém, um sensível apelo... Tenham, daqui a um mês, um Feliz Natal!

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Caminhada

Eu caminho o Rio
Mas, na verdade, é o Rio de Janeiro que me navega.
São as pessoas vindo de algum lugar e me atravessando os poros
Penetrando minha alma com seus cheiros e sorrisos.
Um grupo de jovens fuma num canto, em roda, na hora do almoço,
Os taxistas conversam sobre o futebol,
Na Praça do Pequeno Jornaleiro, crianças se aglutinam e comem cola.
Eu caminho o Rio
Mas na mais pura verdade é ele quem me passeia.
São as saias rodadas e os tailleurs,
São os ternos e as camisetas regatas,
São os sem teto, sem trabalho, desnudos, aflitos, cansados.
É a cerveja suando no boteco da esquina.
O copo de uísque no fim, tintilando com o gelo se derretendo
Como vós
E que venha a nós o vosso reino,
Ó Cristo Redentor,
Pois só te vejo de costas ao ir voltando para casa.

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

O silêncio são palavras?

Por muito tempo, depois de muito tempo, quebro meu silêncio, em contraponto, ouço a chuva cair lá fora. Eu aqui dentro.
Confesso que me ausentei. Sou uma pessoa de ausências, mas a vida prega peças curiosas. Faz exatamente uma semana, se considerarmos o agora como a quinta-feira que já se foi, que recebi a triste notícia que o pai de um grande amigo meu havia morrido.
A notícia veio pelas ondas cibernéticas do MSN. Após o frio comunicado, minha amiga me ligou e pude ouvir sua voz compenetrada me contando os detalhes sobre o enterro que já havia sido. Pensei, enquanto suas palavras soavam no meu ouvido: “(...)”.
Hoje, fomos os dois, eu e essa amiga, que mantêm uma semelhança enorme comigo, visitar o rapaz simpático que me possibilitou um dia ter tido a honra de conhecer seu pai.
Quando o vi, e já fazia tempo, só pude abraçá-lo sem encontrar palavras, mas as palavras eram dele. Relembramos o discurso do sábio quando esse meu mesmo amigo viajou à França para complementar seu doutorado. Calado, me lembrei que chorei naquele dia. À minha frente uma foto sorridente do mesmo senhor que me olhou no fundo dos olhos e me disse que eu conseguiria. E eu consegui. Creio que hoje, pela manhã, recebi o último e-mail da minha orientadora a respeito de sua análise do meu último capítulo e minha conclusão. Num e-mail simples, ela decretou: “Seu capítulo 5, que gostei muito, e conclusão estão liberados. Hoje vou para Praia Vermelha, mas amanhã ficarei em casa ate às 19h. Me ligue, ok? Abração, Eu”
Lembrei do pai desse meu amigo. Não preciso de nomes. Nem sei quem sou nesse mundo. Mas suas palavras ainda ecoam em mim. Na época eu passava por problemas, não sabia nem se ia passar na seleção de mestrado. Passei e aqui estou, depois de muitas semanas em claro aprontando tudo, aqui estou, ainda com o sono atrasado, com olheiras enormes. Porém, assim que saí daquela casa, onde, pessoalmente, reafirmo que reside o amor, apenas sorri.
Aqui estou sabendo que tudo se esvai rapidamente. Não há dúvidas. Mas, também, estou firme na certeza de que nada é por acaso e de que no fundo, no fundo, o silêncio são as palavras.
Por isso, só pude sentir o beijo gostoso de minha mãe em minha cabeça. Não sei se por perdão ou pedido de desculpas por minha quarta-feira complicada. Só pude fazer planos com meu pai sobre uma possível reviravolta em minha vida profissional e a perspectiva de poder, para nós, pagar sem ser em parcelas o seguro do carro popular que ele ainda paga para que eu desfrute.
Por isso hoje, só pude ir dar minha aula costumeira e voltar para casa cansado e, inevitavelmente, sem pagamento. Pude voltar para casa e olhar meus pais e pensar que a vida se esvai, mas que não há silêncio entre nós. E que no fundo, no fundo, me contradisse ao dizer a pouco que o silêncio são as palavras. Talvez, um beijo na cabeça, um sorriso, substituam o silêncio, substituam as palavras e resumam o que é família.
Uma mesma família que se une na morte. Uma mesma família que vê no ato da perda a conquista de um novo caminho.
Seu Nonato, muito obrigado. Onde o senhor estiver, muito obrigado.

sexta-feira, 17 de outubro de 2008

Porque assim somos feitos

Porque é do amor que fomos feitos
E quando não
É pela simples celebração dos corpos juntos.
Assim fomos feitos
Em movimentos contínuos e suados
Num vai e vem harmônico
Que não aprendemos
Apenas recebemos como dádiva
Assim que fomos feitos.
E é nessa ilusão pela busca do perfeito
– O corpo, a mente – que percebemos que somos falhos
No amor
Na vontade de amar.
Pois se amamos pouco, perdemos
Se amamos demais, tiramos.
É um mesmo vai e vem contínuo
Eterno.
Porque é desse amor que fomos feitos
É dessa ira que saímos.
Dessa ilusão que nos fazemos
E quando não
É o amor que nos sustenta
E se confunde na simples celebração dos corpos juntos.
Enfim somos feitos,
Lançados harmoniosamente no caos,
Suspirados
Somos a conta de uma única gota
Que sobrou de um falo cansado.

17 de outubro de 2008
Bruno Alvaro

O que é um padrão de beleza?


Ontem enquanto descansava um pouco a mente após desgastante leitura do livro de Antonio García y García, Historia del Concilio IV Lataranense de 1215, me deparei com algo na tevê, um clipe antigo que marcou toda uma geração: Beat It do astro pop Michael Jackson.
Parte integrante do disco mais vendido da história da música mundial – Thriller –, tal faixa, que rendeu o supracitado clipe e erigiu, sem contestação, o dito cujo Peter Pan como um dos caras de maior sucesso nessa área de manifestação musical, possui coreografias esplendidas, uma musicalidade fantástica e claro, clichês típicos do saudoso anos 80.
Mas o que mais me saltou os olhos acerca do visual de Jackson em 1983 foi o auge de sua beleza. Não sou o único a defender que mesmo na sua época de Jackson Five, Michael era uma criança negra fofinha e muito bonita – sim, claro, seu narigão era feio, mas eu tenho narigão também e me acho bonitinho!
Procuro entender a obsessão desse artista em tornar-se mais “bonito” ou mesmo, não tenho certeza sobre, desvencilhar-se de sua história triste quando criança, seus traumas, etc, talvez, não sei, ele associe isso a sua raça, cor de pele, vai entender? Enfim, não buscarei objetivos sobre sua descoloração, tampouco, acredito que a explicação acerca de uma doença de pele, seja o real motivo para o embranquecimento do cantor.

O tema da minha voz de hoje, na verdade, versa muito mais a respeito de como ele estava bonito em 1983! Putz, que negro bonito! Confesso que a cirurgia no nariz, afinando-o, porém, nem perto da ausência atual (afinal, quem não sabe que ele quase perdeu o nariz por tanta plástica?), o deixou com traços finos, na minha opinião nem femininos nem tão masculinos - no ponto! Apesar, que algumas mulheres adoram o tipo bruto, rosto fechadão, mas isso, fica a cargo de vocês, senhoras! O cabelo, estilo cocota, não tão liso, apenas cacheado, a pele de um negro chocolate, o famoso "marrom bombom brasileiro" (ainda muito próximo de sua infância afro), davam um tom realmente bonito ao rapaz talentoso e ótimo dançarino. Fico pensando quantos quadris femininos não desejaram rebolar juntinhos com o cara (sim, eu sei, tem gente que diz que ele não gosta da fruta...), mas, eu garanto que um homem bonito e bom dançarino é irresistível! Veja o meu caso, não sou um Fred Astaire, no entanto, quando ensaio meus passos, minha preta fica toda assanhadinha! Um dia ainda viro um pé de valsa, minha preta, um dia ainda viro, prometo!
Me questiono, assim, sobre o que é o padrão de beleza, não só para a sociedade, mas para o individuo, o ator social. Engraçado como atualmente quase não se fala e, ao mesmo tempo, fala-se em indivíduos. Em tempos de identidade e alteridade, muita coisa se choca a conceitos e definições.
Digo isso, pois fico no patamar de não saber definir minha raça. Em minha certidão está assinalado pardo, o que é ser "pardo"? Nem sei.
Sei, sei... Há imposições sociais, histórico de uma falsa superioridade, racismo, preconceito. Porém, mais uma vez, me pergunto: Qual é o padrão de beleza? Dizer que é "pardo" é escapar de algum preconceito? Essa era a saída?
Enumero e perco as contas de pessoas brancas, "pardas", negras, amarelas e verdes que são consideradas lindas, enumeram a People (que, vala-me Deus! De “povo” não tem nada!) ano a ano. Entretanto, como muita gente, também brinco e, sarcasticamente, num bar, na rua, num show, no shopping, aperto mais forte a mão de Ana (esse é nosso código) e aponto quem acho feio ou feia, mal vestido ou vestida, etc, sem se esquecer, é lógico, que algum casal deve estar fazendo o mesmo conosco. Coisas da vida.
Mas mesmo assim, qual é o meu padrão de juízo? Como julgo o que é belo ou feio? Veja o caso do Michel Jackson. Por mim, ele teria ficado no negro estiloso e lindo de Thriller e acho até que me aparecerá gente que discordará sobre minha classificação de “mais que belo” nesse período de vida do cantor pop.
Doente, ele? Não sei, pode ser. Contudo, recentemente, li uma notícia de uma modelo brasileira que aumentou sua prótese de silicone nos seios, pois, além de galgar o primeiríssimo lugar entre as mais peitudas do mundo, ou a mais (?), acha isso bonito! Bom para ela, ruim para sua saúde, sua coluna, seu bem-estar.
Porém, a vida não se faz só de seios, embraqueamento, bronzeamento, alisamento. A vida se faz no trajeto pela busca da felicidade. E com sinceridade? Se o Jackson é feliz e busca ainda a felicidade com suas transformações físicas – torço por ele. O importante é a satisfação com o corpo e a busca, moderada, por essa tal satisfação.
Para encerrar.:
- Não. Eu não faria uma plástica para afinar o meu nariz batatinha. Posso conviver com meu nariz de porquinho, feliz da vida! E também não alisaria meu pixaim: meu cabelo estilo “Coalhada” está ótimo assim!



* Coalhada foi um famoso personagem do humorista Chico Anysio. Tinha uns cabelos cacheados e desengonçados. Uma preponderante barriga e uma tradicional camisa do Vasco da Gama.

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Um horizonte distante para a janela da alma

Janela lateral do prédio do Paço Imperial

Esse grito vai sem delongas ou pieguices dedicado a quatro pessoas. Sem muita revisão, sem muito gargarejo ou ensaio. Talvez saia rouco e desafinado – e quem não desafina na vida?
Vai para você Gustavo Alvaro. Vai para você Ana Lúcia. Vai para você Carolina Fortes. E vai para você, minha cara orientadora. Tenho meus motivos. Meus muitos motivos.
Ontem foi dia dos mestres. Maestros que ensinam a ler, escrever. Ensinam em escolas e universidades por esse Brasil. Ontem foi um dia confuso para mim. Mas, um dia que não ensinei, apenas aprendi. Pois nessa arte de ensinar sempre há suas surpresas e a gente aprende mais do que ensina.
A minha veio numa notícia de início desastrosa para minha vida organizada em prol de minha pesquisa histórica que, como bem salientado por Carolina, não deve ser o único foco da nossa vida. Me conformei. Mas não era conselho de conforto era conselho de alguém que sabia o que estava dizendo.
Meu semblante mudou um pouco, já sorria para Gustavo e observada seu novo livro de partituras para viola. A voz embargada que Ana havia ouvido minutos antes pelo celular, possuía uma firmeza conhecida e natural. Eu até já sorria.
O mesmo celular vibrou. Entrei no elevador só. Poucos segundos me separavam do que meses, dias, horas antes eu vislumbrava no horizonte distante. Esses mesmos segundos, me remeteram ao passado. Ao caminho que tracei até ali: o horizonte não era distante, na verdade, era aquele momento. A tranqüilidade me domou mais uma vez.
Um bom orientador não se resume em um milimétrico olhar crítico sob e sobre nossos textos. Não se faz e se perpetua, simplesmente, pelo conhecimento prévio de livros, artigos, caminhos. Não! Definitivamente não! E hoje acabei tendo essa certeza - que já me era clara.
Com pesar uma notícia me foi dada e com uma segurança tamanha a solução encontrada. Uma solução de arrepiar os pêlos do braço. A tensão foi passando. Segredos mais uma vez sendo guardados.
A janela foi se abrindo e um raio de sol foi transpassando as nuvens densas. Mas o caminho ainda é longo, pois o tempo vira. Mas por que desesperar?
Coincidências da vida? Não sei. Mas quando acabo de gritar o que aqui gritei, que música vocês acham que começou a tocar?
Um abraço terno em vocês, viu?
Divido minha voz e cantarolo aqui uma das muitas belas canções da fértil parceria entre Ivan Lins e Vitor Martins. Pois não devemos nunca nos desesperar, jamais!

Desesperar, jamais
(Ivan Lins e Vitor Martins)

Desesperar jamais
Aprendemos muito nesses anos
Afinal de contas não tem cabimento
Entregar o jogo no primeiro tempo

Nada de correr da raia
Nada morrer na praia
Nada! Nada! Nada de esquecer

No balanço de perdas e danos
Já tivemos muitos desenganos
Já tivemos muito que chorar
Mas agora, acho que chegou a hora
De fazer valer o dito popular

Desesperar jamais
Cutucou por baixo, o de cima cai
Desesperar jamais
Cutucou com jeito, não levanta mais

* Do disco: A Noite (P 1979)

quinta-feira, 9 de outubro de 2008

Nem nostálgico, nem saudosista, nem tristonho: Apenas um antiquário de lembranças!


Recebi um único comentário (milagre, milagre!) para a voz anterior. Um comentário, anônimo, que dizia, aconselhava: “seja feliz.”
Primeiro, fico muito feliz quando alguém comenta por aqui, já que a maioria dos comentários que recebo sobre as vozes d’O Ventríloquo me chegam via e-mail. Sobre o comentário, como um todo, realmente não acho que eu seja uma pessoa “nostálgica”, tampouco, triste. Aliás, nem toda pessoa saudosista ou nostálgica é triste.
Quando escrevi, soltei aquela voz que foi uma tessitura, digamos, o tenor para uma melodia para contralto, eu estava muito bem, obrigado! Ou seja, a voz que surtiu a voz do nosso amigo ou amiga anônimo, era companheira de uma voz anterior (um outro texto), mas que se encaixou bem na melodia como um todo, tanto que gerou som vindo de alguém que, infelizmente, não se identificou.
Por falar em saudosismo... Hoje, por exemplo, encontrei pelos corredores da vida uma amiga (oi Nanda!) que reclamou a respeito do meu sumiço. Mandou beijos para os meus pais, lembrou que em setembro foi aniversário da minha mãe, enfim, conversamos rapidamente, pois a vida segue sempre seu rumo. Senti que o momento saudosista – mas não tristonho – foi quando calculamos que já fazia dois anos que não conversávamos mesmo. Que não sentávamos num bar, que ela tinha ido à minha casa pela última vez, etc. Observamos, os dois, naqueles rápidos minutos de conversa, como o tempo passa num instante.
Para calcularmos o tempo que ficou lá atrás fizemos conjecturas, como:
- A esposa do teu Tio Flávio estava grávida.
- É, o filho dele fez dois anos, Flávio Henrique o nome.
- Nossa! Já faz dois anos que fui naquele churrasco?
- Sim, eu e Ana já temos um ano e lá vai fumaça de namoro, para você ver. Estamos quase casando.
- É verdade, o tempo passa...
Enfim, o tempo passa (isso é uma lógica indiscutível) e a gente vai crescendo. Perguntou por meu primo, mandou beijos e se foi e eu me fui, todos vão. Vamos rápido. É necessário que a gente vá. O ser humano precisa ir e vir para viver. E enquanto eu caminhava pela Cinelândia, sentindo um frio fora de época, uma chuva fina na cabeça, pensei lá no fundo: “Logo, logo fará dois anos que sou o cara mais feliz do mundo.”

segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Voltando a tocar violão

Minha última incursão pelas muitas vozes da vida, foi questionar-se sobre o que é a saudade. Hoje percebi perfeitamente que saudade é uma intima vontade pela presença de alguém ou de uma coisa, mas, para haver saudade, saudade da boa, creio eu, que se faz necessária uma via dupla, uma dualidade entre o ser ausente – que te faz falta – ou a coisa que não se tem mais, e, claro, você.
Penso eu, que saudade por saudade é bom. Ou seja, no caso de seres, você sentir que a ausência da pessoa ou animal é retribuída da mesma forma, talvez, expressa de maneiras diferentes, mas na mesma via dupla a que me referi. É claro que você não abanará a bunda para o seu cachorro!
Mas a saudade, ao mesmo tempo que é um sentimento intimo, é multifacetário. Pode e deve estar inserido em possibilidades infinitas, como uma tentativa louca de encontrar o fim do fio de um novelo. Como disse, hoje percebi isso e meu texto anterior que, talvez, para muitos, possa ter tido um tom esquisito, amargo – o que, na verdade não foi – soa agora com um significado impecável.
No fim das contas, minha tese sobre “relacionamento família e um reles namorado” é o que é: uma lógica tão evidente que até o mais primitivo animal, o mais ciumento ordinário compreenderia. Por este motivo, falarei sobre outras coisas na voz de hoje e simplificarei o sentido da saudade em um objeto e não num ser.
No ano de 1998, mais especificamente, no dia 9 de setembro, troquei dois cd’s do extinto grupo Legião Urbana por um do cantor e violonista Toquinho. Um ótimo cd, fruto de sua participação num projeto de shows intitulado “A Luz do Solo”.
Afirmo que um trabalho impecável de arte, voz e violão em sintonia como se fossem um só corpo. Talvez, os amantes das letras de Renato Russo não entenderam muito bem minha atitude e ainda o prejuízo na troca que fiz num sebo que existe até hoje em Nova Iguaçu, próximo ao supermercado Sendas. Um sebo modesto, que, imagino eu, ainda sobrevive graças às vendas de revistas pornográficas antigas, aliás, em ótimo estado e em numeroso estoque. Eu mesmo, comprei várias ali, por um ótimo preço, fotos clássicas de atrizes que hoje se encontram no limbo televisivo. Sem contar as preciosas entrevistas, preciosas mesmo, como a de um Fidel Castro, na edição (com a Maria Zilda na capa - 1985) comemorativa de 10 anos da primeira Playboy publicada no Brasil.
Fiz tal troca (dois cd's por um), por alguns anos antes ter iniciado meus estudos nesse instrumento que reencontro depois de quase um ano de afastamento: o violão. E todo e qualquer trabalho de Toquinho deve ser ouvido por quem gosta desse instrumento.
Não tenho nenhuma foto boa da época em que, de calças de moletom, cabelo grande e encaracolado, seguia eu pela ruazinha atrás do Tênis Club de Mesquita, beirando o rio e ouvindo os sons da quase falida fábrica de sombrinhas Pumar, até a Primeira Igreja Batista em Mesquita, para ter as primeiras lições, estudar os primeiros acordes, papear agradavelmente com meu primeiro professor e, na adolescência, papear abertamente com um adulto era coisa rara, principalmente com alguém cuja alma era de artista.
Realmente, as fotos que tenho são péssimas e vergonhosas. Porém, tenho lembranças ótimas desse período.
Nesse disco do Toquinho há uma música que expressa muito bem e de forma mágica esse momento tão bom e doloroso para todo estudante iniciante nesse instrumento.
A música é pouco conhecida e foi feita por ele em parceria com Vinícius de Morais e o grande violonista Paulinho Nogueira, na verdade, a letra é do poeta Vinícius que, segundo o próprio Toquinho, conseguiu transmitir muito bem as impressões da época em que ele, ainda jovem, tinha lições de violão na “casinha da praça” que pertencia ao seu professor Paulinho Nogueira. O curioso é que músico relata que Nogueira mostrou, certa vez para ele, um choro que só tinha a primeira parte.
Anos se passaram e Toquinho, já célebre cantor e exímio violonista, terminou o choro e, como eu disse anteriormente, deu para o poetinha pôr letra (que pode ser lida ao final desse texto).
Ouvindo agora, nesse instante, essa música, lembro de muita coisa. Lembro das aulas, das dores nas pontas dos dedos naquela época, e que, recentemente, depois de um final de semana inteiro praticando voltaram e já se foram. Contudo, confesso, que em tempos passados, foram meses até se formarem os calos protetores contra o arranhar dos dedos nas cordas de aço do violão chueba que eu usava.
O curioso é que nunca tive um violão. Nunca tive um violão meu. Comprado ou recebido de presente (meu pai chegou a me dar uma guitarra de aniversário e um contrabaixo, mas nunca me deu um violão!). Mesmo sendo canhoto e invertendo as cordas para tocar como um destro tocaria, sempre tive a sorte de ter pessoas próximas que possuíam o instrumento por modismo ou outros motivos desconhecidos agora por mim. Até mesmo esse violão que me chegou às mãos recentemente, é um instrumento que estava sobrando entre os muitos que meu primo Gustavo possui. Engraçado como é a vida. Foi o próprio que, não se por que cargas d’água, pediu um violão para o pai quando ainda era moleque, violão esse, que acabou me jogando no mundo da música. Pois o instrumento ficou jogado em seu quarto, ele não estudava (acabou iniciando-se na música através do piano) e eu acabei pegando “emprestado” e nunca mais devolvi. O chuebinha se desfez com o tempo. Depois, muitos outros instrumentos de outras pessoas passaram na pelas minhas mãos, uns devolvi, o último que tive, fez parte dos despojos de um fim de noivado desfeito. Assim como aquele relacionamento, ele foi se desfazendo com o tempo, até se esfarelar nas bocas dos cupins.
E aqui estou eu, refletindo sobre saudade. Ao som de um dos poucos discos que permaneceram. De uma época em que ainda trocávamos cd’s com os colegas ou com lojinhas de usados. E aqui estou eu, sentindo um cheiro de incenso de bálsamo, no mesmo quarto onde passava tardes decorando revistinhas de cifras...
E aqui estou eu no mesmo lugar, no mesmo lugar que percebi que, por si só, ainda me basto. Sendo assim, não há motivos para saudades de ninguém. Nem do tempo. Nem de mim. Afinal, a saudade é uma mão dupla e minhas teses, no final das contas, sempre se confirmam. E assim como andar de bicicleta: nunca se esquece o acorde de sol maior!

*A Luz do Solo – Toquinho (Lp. Philips – 1985/ Cd. Polygram – 1997).
*Paulinho Nogueira, nasceu em 8 de outubro de 1929 e morreu em 2 agosto de 2003, dentre os ótimos discos que gravou, cabe ressaltar seu último trabalho, o instrumental: Chico Buarque – Primeiras Composições (Cd. Trama – 2002).

Choro Chorado Pra Paulinho Nogueira
(Vinicius de Morais/ Toquinho/ Paulinho Nogueira)
Quanta saudade antiga
Quanta recordação
O toque paciente
De tua mão amiga
Me ensinando os caminhos
Corrigindo os defeitos
Dando todos os jeitos
Pras notas brotarem
Do meu violão

Ah! Como eu lembro ainda
Cheio de gratidão
A hora entardecente
A nostalgia infinda
No modesto ambiente
Da casinha da praça
E eu em estado de graça
De estar aprendendo
A tocar violão

E hoje nós dois
Tempos depois
Damos com nova emoção
Um novo aperto de mão

Neste chorinho chorado juntos
E que tomara renasça em muitos
Pois a maior alegria
É chorar de parceria
Num chorinho que é só coração
E relembrar que o passado
Vive num choro chorado
Pelo teu e o meu violão.

domingo, 5 de outubro de 2008

Afinal o que é saudade?

Há tempos venho tentando escrever um texto digno sobre minha relação com barbeiros e cabeleireiros.
Cheguei escrever um texto maçante, longo e minucioso, no qual eu descrevia velhas lembranças sobre meu incômodo em cortar os cabelos.
Pois bem, será que é chegada a hora de, enfim, refletir sobre esse meu tormento que pode ser de muitos?
Não! Realmente, não!
O corte de cabelo só entrou na voz de hoje pois, pelo segundo mês consecutivo, cortei meus cachos num salão quase em frente ao barzinho onde compro os melhores bolinhos de aipim com carne moída do mundo – melhor até que os do Rio Scenarium!
Esta introdução se justifica, pois o cirurgião capilar que, com esmero, tem deixado minha cabeça menor, demora, entre lavagem dos cabelos, corte, espanada com talco e espelho – que parece nos fazer responder automaticamente: Tá bom... –, exatamente, 60 minutos para completar sua arte. Ou seja, fico uma hora em sua cadeira.
Meus caros, é tempo suficiente para pensar na vida, relembrar causos, sentir saudades... e tudo em silêncio, pois não sou de conversar com pessoas com instrumentos pontiagudos muito próximos às minhas orelhas – fico com um certo receio de que a pessoa pode ser distrair e nessa distração...
Pois é, é a saudade que dá o tom da voz de hoje. Complexa e doce saudade! E não o corte de cabelo. Vamos à prosa...
Há alguns meses, meu sogro comprou uma dessas casas de veraneio pré-fabricada num fim de mundo chamado Unamar e para lá se foi com minha sogra. Enfim, não cabem aqui explicações sobre suas vidas, minha opinião sobre o ocorrido, apenas a figuração do fato. Em finais de setembro, minha Ana entrou de férias, o que por sua sorte coincidiram com as férias de uma de suas irmãs que reside no sertão da Bahia trabalhando para Infraero. Blá, blá, blá, coisas de família, papai, mamãe, titia... Essas coisas bacanas da vida, sabe? Reencontro choroso no aeroporto, sobrinho novinho já na fase maravilhosa das gracinhas, aprendendo a correr e falar: uma felicidade só para todos! Que bom!
Mas onde eu entro nessa história toda?
Lógico que todos foram para Unamar. É uma lógica sem nenhuma complexidade, eu também o faria, se não fosse, simplesmente, namorado. Aqui valem explicações, também lógicas.
Gosto dos meus sogros, são pessoas gentis, bacanas, carinhosas e, também, aparentam gostar de mim e, tenho certeza, que me receberiam com uma alegria só. Mas, acontece que desde meu primeiro namoro, namoro de freqüentar casa, família, tomar café, almoçar, viajar juntos, etc, que aprendi a manter uma distância saudável das pessoas que, mesmo que um dia façam parte, não são de minha família (no fundo nem com todos meus familiares tenho muito contato). Além do mais, ninguém é obrigado a aturar namorado de filha.
Nessa minha experiência passada, que, confesso, foi agradável, no período da adolescência, aprendi muito e, ainda, guardo um carinho enorme por aquele casal que me acolheu e hoje, com a distância do tempo e a maturidade adquirida com ele, percebo que namorei aquela menina que me tratava tão mal por tanto tempo por adorar seus pais e sua irmã caçula (que hoje já é uma moçona!) e nem tanto por aquele relacionamento medonho.
Ou seja, esse texto é fruto da seguinte conclusão: não viajei com minha namorada para Unamar (mas que porra de nome é esse?) e fiquei aqui em Mesquita vendo o tempo passar lentamente e relembrar decorrências da vida. Aproveitei para colocar o capítulo final da dissertação nos trilhos, papear com meu primo, trabalhar uma canção em parceria, ver vídeos com ele, etc. No mais, é um momento família deles, as três filhas, o neto, o genro, enfim, como eu disse, namorado é penetra nesses momentos, creio que namorado não tem nem que sair em foto de aniversário de família. Na verdade, eu teria incontáveis desculpas para não ter ido com Ana para a “terra perdida”, mas no fundo, no fundo, foi por conta do que expliquei, por conta dos princípios que formei acerca de relacionamentos namorados versus sogros. Porém, assim que tudo se ajeitar por aqui, pego um ônibus com Ana e ponho a perna no mundo e vou para lá visitá-los, devo isso e quero isso.
Por isso, meu sábado foi esquisito e comecei a perceber que seria, nos longos minutos que passei no cabeleireiro e esse texto foi tomando forma ainda lá.
Já havia sentido saudades de Ana antes, mas parece que quanto mais o tempo vai passando, mais perceptível fica a sensação de que devemos ficar sempre juntos. Uma coisa de para sempre, entende? Sendo assim, começo a pensar em tomar uma atitude para poder aparecer nas fotos de família e não me preocupar com meus princípios teóricos sobre relacionamentos.

Enquanto o céu escurecia e eu me preparava para ir pr’o Flamengo declamar poesia, fiquei pensando nela, no que ela estava fazendo, no vento batendo em seus cabelos, no seu cheiro, no seu sorriso. O céu desabou. Acabei não saindo – seria minha distração do sábado. Fui tocar violão e duas músicas não saiam da minha cabeça: “Diga lá, coração” e “Espere por mim, morena”. E fiquei cantando como passarinho na gaiola, as pontas dos dedos doloridas por conta de tanto tempo sem manejar o instrumento... mas, dor maior era a do coração.
O toró caindo, raios belíssimos no céu e sentei-me na varanda para prosear com meu pai. Conversamos sobre a possibilidade d’eu me mudar e ter que alugar um apartamento por conta de uma proposta de emprego (que estou torcendo que dê certo), sobre a vida, sobre casamento, sobre o futuro. Depois de uns trinta minutos – uma coisa de verão fora de época, em plena primavera? – a chuva parou e o céu limpou.
Peguei o carro e resolvi dar uma volta, deveria entregar uns dvd’s na locadora, eu tinha que ver o mundo. Ver o sábado. Liguei para um amigo próximo. Ele estava com dor de cabeça. Desisti de incomodá-lo com minha saudade de rapaz apaixonado. Sábado chato. Não há bar para mim. Não há chope gelado. Não há aperitivos. Isso tudo a saudade levou. Isso tudo só tem graça com Ana.
E na volta para casa, peguei o celular e consegui falar enfim com ele, já que na “terra perdida” conseguir um sinal é fazer chover no sertão, e enquanto ouvia sua voz doce dizendo que me ama, me perguntei por dentro: Afinal o que é saudade?

*Espere por mim, morena (Gonzaga Jr.) no disco Começaria tudo outra vez... (P1976)

**Diga lá, coração (Gonzaga Jr.) no disco Gonzaguinha da vida (P1979)

sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Por onde será que anda a vontade de saber?

Quarta-feira última, participei do lançamento de um livro acadêmico no qual tenho um artigo. Não citarei o nome do tratado, pois quero evitar possíveis mal-estares pela crítica que aqui farei. Claro que a crítica a que me refiro não é a respeito do livro, mas sobre algo que aconteceu nos bastidores do lançamento e que refletem um certo problema que já vem se estendendo.
O momento sem dúvida foi de festa. Creio, infelizmente, que uma festa um tanto contida e que merecia mais ovação pelo histórico tão trabalhoso que foi o trajeto dos artigos até a prensa. Mas como já ressaltei aqui várias e várias vezes: os tempos são outros. São tão outros que minutos antes, presenciei uma cena que, realmente, nunca pensaria ver (mas no geral, o lançamento foi bonito e a mesa redonda, da qual participei como um dos conferencistas, foi, digamos, peculiar).
Como estava dizendo, minutos antes de assumirmos nossos postos na grande e bonita mesa presente no Salão Nobre, ouvi a talentosa organizadora do tratado, um tanto desanimada, virando-se para mim, em tom de reflexão: “Ando tão cansada. Decepcionada com essa nova geração de orientandos/bolsistas...”. Realmente, me assustei, não pela crítica àqueles que trabalham com ela, mas, pelo cansaço na fala, considerando que a mesma é ainda uma jovem professora. Tentei amenizar, enumerando os ex-orientandos que agora já fazem parte do panteão acadêmico federal ou que têm seus artigos várias vezes publicados por revistas especializadas, mas creio que não foi o suficiente para levantar seu ânimo naquele momento. Pela primeira vez a ouvi citar nomes, um por um, daqueles que não estavam fazendo jus ao apertado dinheiro disponibilizado pela Capes e, acho, que no fundo, do tempo dispensado por ela para orientação. Tempos outros realmente. Citei um nome. Um nome cujo futuro é de estrelas. Jovem rapaz ainda. Caminhando, mas já com passos largos. Ela balançou a cabeça que sim. Mas apenas ele, pelo visto, para ela, configura-se como alguém que ainda vale noites de leitura.
Dali saí com Ana e Thiago, rumamos para Tijuca, fomos comemorar o prenúncio de bons ventos para mim e aproveitar para engolir à seco o empate do Fluminense em pleno Maracanã.
Enquanto estávamos sentados no Vaca Brava, ótimo bar tijucano e razoavelmente barato, comentei sobre meu susto de horas antes. Ana e Thiago riram e me falaram de uma frase que minha falta de atenção na mesa não captou. Em “púlpito” ela não deixou passar seu descontentamento e assinalou enfaticamente que nosso laboratório de pesquisa não é um “clube social”. Curioso, horas antes da mesa redonda, parei para tomar um choppinho com dois amigos e um deles alertou sobre muitos dos que ali estão, apenas o estão por encontros, pela simples oportunidade de ter um lugar. Identidade, talvez. Me fez lembrar aqui de Marc Auge (são tantos os lugares e não lugares não é mesmo?).
Entre um xingamento e outro, um gole de cerveja, uma garfada na deliciosa carne-seca com aipim, Thiago virou-se para nós e, sorrindo, sacramentou: “É o problema do entre safras. Ela ficou mal acostumada com bons orientandos, que levavam o trabalho de pesquisa a sério.”.
Quase não discordo do meu grande amigo, mas, dessa vez, sou obrigado a seguir outro rumo.
Acho que na verdade, a preocupação daquela professora, com uma bagagem acadêmica enorme, é a de perceber que todo um trabalho de anos e anos de dedicação e construção pode estar indo por água abaixo nas mãos de uma “nova geração”, que no fundo é reflexo do que tem sido o nosso Brasil: muita festa e pouco fazer.
É claro que não se pode generalizar. Há muita gente boa por vir. Muita gente compromissada, mas, por enquanto, sua frase anda ecoando na minha cabeça e sua preocupação passa ser a minha!

quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Eu apenas queria que você soubesse...

Aquela tarde estava fria e pedia uma saudável reclusão em casa, no sofá, com algo quente para beber. Porém, eu necessitava urgentemente comprar algumas picuinhas técnicas para fechar a redação da minha dissertação. Refiro-me à tinta da impressora que, como de praxe, acabou quando não deveria acabar.
Querendo evitar transtornos e demora em achar vaga para estacionar o carro, decidi ir à Nova Iguaçu de ônibus. Aqui cabe uma explicação rápida para não ter comprado o cartucho em Mesquita, cidade onde moro: Eu queria adquirir, também, um porquinho de barro, moda no Brasil e que tem feito sumir as moedas das caixas registradoras.
Quando cheguei ao calçadão, parece que trouxe comigo a chuvinha fina que já branqueava os morros mesquitenses. Nada que me afligisse, afinal, não estava de guarda-chuva, mas usava uma bela boina quadriculada que Gustavo me deu – ou trocou por uma falsificação de chapéu panamá que comprei na Lapa um dia.
Acontece que nem todos têm uma boina quadriculada e a dança das “sombrinhas” me jogou da calçada para as apertadas ruas, disputando espaço entre carros e camelôs. Comecei a me arrepender de ter saído de casa.
Como de costume, visitei as Lojas Americanas para ver os lançamentos musicais e os DVD’s em promoção. E lá estava numa baia de livros, um tanto esquecido, só e empoeirado: “Gonzaguinha e Gonzagão: Uma História Brasileira”.
Apesar de ser um grande fã do filho e conhecer o que todos da minha idade conhecem do pai, não sabia que uma biografia sobre eles, juntos, havia sido escrita. Curiosidade. Bom preço. Acabei comprando.
Triturei as 381 páginas bem escritas pela jornalista Regina Echeverria em, exatamente, três dias! Nada demais, você me diria e eu concordaria. Acontece que nesse meio tempo, li, claro, outras muitas coisas obrigatórias.
Esse livro, na verdade, tornou-se um vicio nesses dias. Se minha cabeça doesse na tentativa de fechar um parágrafo da dissertação, lá ia eu folhear a dupla biografia que, no fundo, tornou-se uma só pelas mãos hábeis da escritora.
Sobre Gonzaguinha eu já sabia muito, de ouvir falar, de ouvir cantar, de navegar o ótimo site sobre sua vida e carreira, ou então por conversas com meu grande amigo Celso Vicente Jr. que me fez ouvir esse cantor e compositor com um olhar mais atento.
Gonzagão é folclórico. Faz parte não só da cultura nordestina – belíssima, por sinal – como, também da cultura brasileira. Dele eu conhecia e conheço clássicos juninos e julinos da época de menino, quando dançava quadrilha na rua e na escola. Sobre sua vida, pouco eu realmente conhecia.
A questão é: o livro de Regina ao mesmo tempo em que é doce, é também um soco no estômago. O bom soco no estômago. Pois, ao contrário de muitas biografias que costumamos ler, a autora não constrói/ reconstrói os personagens para sacramentarem-se definitivamente como ídolos. Não há tipos ideais.
A pesquisa de Regina Echeverria para o livro é digna de nota, sem contar que ela teve uma sorte tremenda de Gonzaguinha ter deixado muita coisa registrada em fitas e, claro, sua bela família ter guardado e cedido tudo para a elaboração dessa pérola.
Gonzaguinha, talvez, mais que Gonzagão, está no livro cru, como sempre foi. E muitos anos antes de surgirem Los Hermanos e afins, com uma consciência enorme de naturalidade ou “anti-marketing”.
Regina não fabricou ídolos, não tratou o leitor como uma caixa vazia esperando por informações bonitinhas sobre a vida do pai e do filho, ao contrário, seu enredo traça, realmente, uma “história brasileira” de conquistas e afrontas, mágoas, alegrias, ou seja, vida.
Duas vidas que poderiam se confundir com as nossas. Com as dos muitos retirantes que vêm do Nordeste para o Rio de Janeiro e fazem sucesso ou pelo menos vivem melhor que na terra natal. Como a história de muitos jovens nascidos e criados nos morros desse mesmo Rio de Janeiro e que acabam depois de muito custo conseguindo, de alguma foram, brilhar.
O livro é uma viagem pela história da música brasileira, uma viagem pelos anos de chumbo da Ditadura. Um retrato interessante da sociedade ou sociedades desde os anos 30 até os anos 90.
As divergências entre pai e filho. A dúvida. Os desafetos. O sofrimento. O reencontro. Uma biografia que mais parece um roteiro de filme. De um bom filme.
Enquanto esperava na longa fila do caixa das Lojas Americanas, pensava eu ao olhar a contra capa do livro: “Estou fazendo besteira em comprar isso. Vou acabar não lendo por falta de tempo ou pior, lendo e não gostando. Onde já se viu uma biografia de dois biografados?”
Eu estava enganado. As histórias não se confundem. Acho que nem se complementam. Mas há um elo tão bem feito pela autora – e pela vida –, que vai e volta nas duas histórias, que em vários capítulos, confesso ter chorado.
A morte encontrou pai e filho. Talvez, o segundo tenha a encontrado cedo demais, tendo muito ainda a fazer. E isso, durante muito tempo, o tempo que conheço e que me lembro de aprender a apreciar as canções de Gonzaguinha, me deixava triste. Contudo, depois que li o último parágrafo do capítulo 22, me dei conta de que tinha que ser assim e lembrei, de ainda bem garoto, em 1991, ouvir minha mãe dizer da sala vendo telejornal: “Ih, Gonzaguinha morreu...”.
E, agora, é apenas mais um grande artista esquecido, que vez ou outra toca nas rádios. Luiz Gonzaga, o pai, creio, eu, ainda anima as poucas festas juninas que ainda acontecem pelo Brasil. Agora, a poesia rasgada e crítica das canções de seu filho. Essas, só quem gosta muito de música e tem um bom faro de arqueólogo de baias para encontrar seus discos, porcamente, relançados em Cd. E isso é o que “eu apenas queria que você soubesse...”

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Ninguém merece ser feliz ao acaso

Enquanto esperam apressadas para mergulharem no sumidouro profundo que são as quatro pistas da Presidente Vargas. Enquanto se acotovelam e não se olham, as pessoas que estão ao seu lado não sabem que você está ali. Você não existe e logo sumirá. São cheiros de fragrâncias misturadas ao suor dos corpos no fim do dia – mas ninguém sabe que você está ali.
Mal sabem que por trás desse olhar pacato, comum, jaz uma vontade imensa de gritar, parar o trânsito sem ser por sinal vermelho, congestionamento, assalto à mão armada ou atropelamento.
Mal sabem que você quer abrir os botões da camisa e pôr para fora a todos pulmões um grito de liberdade, um grito vazio de liberdade, como um mendigo que se hospeda nas marquises dos prédios da Presidente Vargas. Um grito. Apenas um grito. Elas mal sabem que é um grito que você quer dar ali parado, pacato.
Ninguém merece ser feliz ao acaso.

A cada pista que você atravessa, em cada pessoa que você se esbarra, é o esbaforido suspiro dos pés apertados pelos tênis que hoje você resolveu usar. Cada contato humano é tão sub-humano que a voz do teu grito não seria ouvida por ninguém, nem mesmo por você. Pois a sinfonia descadenciada que você ouve das buzinas, dos burburinhos das meninas e do comentário dos rapazes não quer dizer que hoje seja sexta-feira. Querem dizer que a vida segue. É triste, mas ela segue sem você.

E você, quando vê o boneco do último semáforo piscando, piscando, piscando, avisando intermitentemente que é hora de parar, você corre. Você corre e não pára mais.
Ninguém merece ser feliz ao acaso.
Pega a Primeiro de Março como um louco, ignora os obstáculos da calçada. Você quer ser vento muito mais do que visto e ouvido. Seu grito agora é seu corpo e seus pés calejados te dão a direção do nada que você quer alcançar. De repente você pára.
Esbaforido, coloca as mãos nas coxas, levemente ergue os olhos e vê tantos prédios, tão bonitos, tão cheios de gente, tão cheios de vida. E não se cansa de olhar. Roda de braços abertos no meio do Largo da Carioca, não quer ser mais vento, quer ser pássaro. Quer olhar de perto as janelas dos prédios. As janelas acesas dos prédios. Mas você ainda está no primeiro andar.
Desengonçado, como um louco varrido, sobe correndo o prédio mais alto que encontra, à sua cola um guarda gritando, os contínuos olhando assustados, o velho ascensorista com as mãos na cabeça, pessoas sem entenderem nada, executivos, madames, atendentes e boys – ninguém merece ser feliz ao acaso.
E você corre, já não é mais vento, quer ser pássaro e mais nada. Já não há mais grito, nem sede, nem poços d’água. No alto do prédio você apenas abre os braços, estufa os pulmões e resolve que nesse dia você é um pássaro que canta com notas agudas: Ninguém merece ser feliz ao acaso.

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Excessivo


Se um dia tu me abandonares
Chorarei.
Chorarei dos olhos ficarem vermelhos.
- Vermelho sangue, eu diria.
O mesmo sangue quente
Que corre em minhas veias
Que se abririam se um dia tu me abandonasses.
Passarei noites em claro
Se um dia tu me abandonares.
Noites tempestuosas
Com reflexos de lembranças
Dos tempos que fomos felizes.
E quando eu adormecesse
O dia acordaria
E aqueles que quisessem ver minha face
Temeriam a falta de coragem
Para encarar meus olhos crus.
Se abrissem a porta do meu quarto
Um odor fétido de sangue e morte
Sairia e tomaria tudo de assalto,
Como um ladrão na calada da noite.
Mas isso, só se um dia tu me abandonares
Porque agora, meu bem,
O tempo é calmo.
Mas o tempo vira
Se um dia tu me abandonares.
Pois no dia do abandono
Os olhos choram,
O sangue jorra
E meu mundo acaba.
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14 de setembro de 2008 – 04:58 AM
Bruno Alvaro

sábado, 13 de setembro de 2008

Sem o calo da vitória

Confesso que há dias estou pretendendo escrever este texto. Mas esperei, pouco a pouco esperei, o tempo maturar. Pois as palavras são assim para mim, elas demoram a se encaixar no texto – quem me dera fosse assim na vida –, elas já estão ali na minha cabeça, num martelar constante, querendo sair. Porém, acabo ocupando-me com outras imagens e as deixo frouxas num canto da mente e acho que isso as emputesse de tal maneira que quando quero resgatá-las com um fechar de olhos, tenho que forçá-los mais do que de costume para que elas reapareçam. E nem sempre tal sensação é agradável.
Como balbuciei, o tempo fez, mais uma vez, seu trabalho e eis que elas agora podem fluir mais tranqüilamente no papel virtual, elas tranqüilas e eu forçando os olhos – coisa das mimadas palavras!
Uma semana atrás participei de um evento muito interessante que acontece todo primeiro sábado de cada mês: Um Castelo de Palavras.
Ele ocorre no Centro Cultural Municipal Oduvaldo Viana Filho, local mais conhecido como “Castelinho do Flamengo”, realmente e infelizmente, não busquei informações sobre quanto tempo esse sarau poético acontece, ou se ouvi sobre não atentei muito. Só sei que serei um dos muitos freqüentadores assíduos. Isso por dois motivos: primeiro, por tratar-se de um encontro leve e alegre de artistas, em sua grande maioria, poetas, onde ouvimos música, vemos apresentações cênicas e, claro, degustamos poesia. O segundo motivo, jaz no fato de que nele jovens poetas abrem suas gavetas e jogam ao léu seus versos. Esse foi o meu caso. Por isso, forçarei mais um pouco meus olhos e...
Um dia ouvi Chico Buarque explicando os motivos que o faziam ficar tão a vontade em palcos estrangeiros, citando João Cabral de Melo Neto, ele falou sobre a ausência do “calo da vitória...”. Acho que é a melhor analogia para eu destrinchar os motivos que me fizeram sair tão feliz do Castelinho do Flamengo naquele sábado à noite.
Escrevo poemas há, aproximadamente, uns doze anos, acho que um pouco mais, porém, costumo datar meu inicio como poeta a partir de “ARGONNE – 1918 (Carta-poema fictícia)”, datada de 1996. Já a “projeção” como poeta era restrita às namoradinhas platônicas ou às namoradas dos amigos que sempre me encomendavam um poeminha aqui outro acolá, claro, a fama de menino das palavras ficava com o contratante, sendo assim, essa segunda sentença se restringe aos garanhões de treze e quatorze anos que, quando eu tinha a sorte de não ficar sobre ameaças de violências físicas, sempre me davam algum agrado, como ser o primeiro a ser escolhido para o time na hora do futebol da escola.
Os tempos passaram, as coisas mudaram, a timidez sumiu um pouco e descobri que escrever era vício e trazia, além de elogios e críticas, problemas. Um dia me soltei de vez e pegou a alcunha de poeta aqui, poetinha ali, acho que já estava na faculdade, bebia e de quando em quando também fumava. Poeta.
Mas recitar poemas para amigos bêbados, ou para meninas apaixonadas, talvez, até receber elogios em sites para escritores iniciantes é uma coisa. Se expor meio chapado, deprimido ou apaixonado, também. Agora, pôr a cara à tapa, para pessoas nunca dantes vistas, entre elas poetas já até conhecidos no “submundo alternativo da poesia” é, sem dúvida alguma, não contar com o “calo da vitória...”.
E não é que foi bom? Não é que me deixou satisfeito?
Como eu disse, saí do Castelinho do Flamengo leve, falante, pensando em várias coisas, me programando para voltar... e olha que quando meu amigo de carreira Gustavo me convidou para aparecer com ele por lá, eu até pestanejei, mas acho que, na verdade, no fundo, no fundo, cerrei os olhos bem apertadamente para ver se aquelas palavras que eu havia deixado de lado, esquecidinhas num canto da mente, me perdoavam e voltavam para mim.

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

A arte da crítica

Bem recentemente, tenho observado algumas coisas interessantes no meu cotidiano. Tornou-se comum, para mim, toda quarta-feira caminhar no Centro do Rio de Janeiro em busca de nada. Absolutamente nada. Na verdade, não sem um certo objetivo, nem que seja o “olhar a moda”.
Acho que no fundo, quero evitar os embaraços da viagem de ida para o Centro, como a demora do ônibus e o congestionamento na Via Dutra, por exemplo. Mas a questão é: caminho para evitar as mazelas do trabalho.
Atualmente, no Laboratório de Pesquisa que venho participando, não sem um certo orgulho e vontade de aprender mais, e claro, ver a moda, nossa orientadora tem invocado a arte da crítica, que ao meu ver, é extremamente necessária no, vulgo, meio acadêmico. No entanto, fico sempre com a impressão que meu trabalho ali tem dado início para o fundamento do “cara chato”, “arrogante”, enfim, “o picuinha”, coisas do tipo. Tempos outros os de agora. Lembro-me que, lá pelos idos de 2005, quando cheguei a esse mesmo Laboratório de Pesquisa, para mim, receber as críticas era o majestoso sinônimo de “estão prestando atenção em mim...”, claro, que não descarto a possibilidade da fogueira das vaidades, não afirmo que muitos dos meus críticos na época se valeram de minha normal imaturidade como projeto do projeto de futuro talvez pesquisador para inflarem seus egos. Nada que me abalasse a ponto de tecer a impressão da qual acho que algumas das pessoas do presente Laboratório têm tecido sobre mim.

A coisa toda gira, talvez, em torno da formação que eles tem e que eu não tive, não no diploma, mas, quem sabe no cotidiano dos egos dos professores. Talvez, por isso, não sei, quando ali cheguei, receber uma crítica fosse algo absolutamente natural e, como disse antes, tempos outros aqueles. Cheguei algumas vezes a ouvir, literalmente, sobre algum escrito meu, ou vários: “Esse texto é sem fundamento...”; “Você escreve muito mal”; “De onde você tirou isso?”; “Que texto horrível...”. Enfim, como afirmei, nada que me abale muito, mas abala.
Um certo ranço é o que eu sinto sempre que inicio minha retórica. O mais preocupante, talvez, seja o fato de, ali, depois da orientadora, eu ter a maior titulação, na verdade, quase titulação. Às vezes penso que isso é um grande problema. Já pensei em me ausentar do ofício de participar dos debates, afinal, não tenho mais que cumprir essa obrigação, encontro-me no estágio final da redação da dissertação e quase nenhum outro mestrando ou mestre aparece por ali para dar as caras. O problema é que eu gosto! Gosto de trocar idéias. Gosto de ver minha orientadora criticando, ardentemente criticando. Gosto de mostrar a quem inicia nas veredas tortuosas de querer ser um dia na vida um, talvez, possível, pesquisador, que essa vida tem seus trancos (e troncos) e barrancos. Aliás, tempos outros. Até mais amenos. Acho que a cada ano que passa, as vaidades tornam-se mais amenas. As brigas teóricas, os egos inflados, tudo tem sido corroído em meio às lamentações de falta de verba, bolsa, e tudo mais.
Mas o ranço continua. Ranço é uma palavra forte. Quem sabe nem tanto. Nem tanto ela deveria aparecer aqui. Mas aparece.

Realmente ainda não são textos brilhantes, os que são escritos e debatidos. Nem os meus eram e nem ainda o são, acho que nunca o serão. Mas a crítica nos faz tentar. E nessa vida exposta que temos, as críticas sempre virão... Como disse não há brilhantismo, talvez em um ou dois já haja, e não digo só sobre os textos, mas sobre as idéias. Todas são boas, uma ou duas, como disse antes, até mesmo fortes e prontas a serem polidas para o brilho futuro. As outras são possibilidades, assim como minhas idéias eram e o são, mas depende de cada um deles (de nós) transformá-las em monografias, projetos, dissertações ou teses, por enquanto, melhor pensar nem num artigo, mas num texto de comunicação.
O teor que eu tinha, o teor do medo, do não ter estudado ali, do “vou ser tragado”, me fez acelerar meu amadurecimento, engolir críticas azedas como se fosse mel.
Um dia escrevo um texto real sobre a arte da crítica, mas o certo é que seu fundamento é o de ter sido, antes de tudo, criticado ferrenhamente, para saber onde ficam as dores e os amores. E dor e amor nesse meio é mais constante do que parece ser. Para ter certeza do momento certo de assentar no chão aqueles que querem voar com asas de Ícaro e afirmar que, sim, o “cavalo da História” é cavalgável para poucos e que vê-lo passar por nós não nos ajudar na impossível tarefa de nos possibilitar perceber “toda a sua espessura histórica”.
Fico com o estranho sentimento de olhar sempre para os lados e para trás ao descer as escadarias do Instituto, afinal, acidentes acontecem.

domingo, 7 de setembro de 2008

Meio fio

Nada mais a fazer
Nenhuma rima nas mangas
A métrica já quebrada.
Ao lado do meio fio
Um córrego se formava
E as águas sujas que ali corriam
No esgoto desembocavam
Poemas jamais lidos
De um poeta abandonado.

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

Uma dissertação ou uma vida?

Taí, mais uma madrugada que divago em meus pensamentos ao som de Edu Lobo, acho que o único disco que tenho ouvido mais assiduamente.
Eu poderia aqui narrar toda minha jornada no dia que se passou, mas hoje quero apenas confessar ao léu minha nudez, a nudez de minha alma. Uma história não muito diferente das muitas por aí.
Sou pessoa de poucos amigos. Mesmo que isso pareça desconfortante ou dramático, é a pura verdade e dos poucos amigos que carrego como pedrinhas numa pequena lata de ervilhas, a grande maioria tem quase o dobro da minha idade, são pessoas cujas carreiras já estão consolidadas, já sonharam seus sonhos, alguns plantaram árvores, tiveram filhos e escreveram livros.
Eis que chego ao ponto máximo de minha solidão (novamente). Virão madrugadas que com afinco tecerei como ourives cada capítulo de algo que não vai além das prateleiras sombrias de uma biblioteca universitária ou do desconhecido Banco de Teses e Dissertações da Capes. E são nessas noites que me questiono, não meu prazer pelo ofício que tenho em mãos, mas os motivos que me levam a fazer o que faço.
Hoje tirei o dia para o claustro. Tomei todas as precauções dignas de um bom orientando, enviei e-mail explicando minha ausência no debate das duas resenhas de livros que confesso ter lido por “orelhas”. Resenhas feitas por graduandos que não tenho muito contato. Não que haja desinteresse neles, pois acredito ferrenhamente que são melhores do que fui nesse mesmo período de vida acadêmica, mas algo pesou mais e não foram só os dois ônibus que tenho que pegar para chegar ao Instituto ou mesmo a volta cansativa para casa. O que pesou foi o sonho. E mais uma vez esse sonho me toma a alma e o tempo que tenho contra mim.

Quando entrei na universidade lembro-me que pensar em fazer um mestrado era um sonho absurdo e longínquo, alguém me fez acreditar no meu próprio sonhar. E foram noites longas. Discussões tolas com meus pais que não entendiam bem meu “trabalho árduo” frente ao computador. Recordo-me das horas de almoço dispensadas para, entre tambores de resina e sacos de talco químico, rascunhar um pré-projeto.
Confesso agora não ter que levantar pesos enfadonhos, disputar cada minuto precioso do meu tempo para pôr no papel uma idéia, um parágrafo sequer. Talvez o que doa, incomode, seja dentro do meu próprio lar isso não ser identificado como labuta.
Por que continuar estudando? A faculdade já acabou há tanto tempo... Para quê doutorado?
Lembro-me bem que no período de seleção para o concurso de mestrado, saí por uns tempos de casa, eram outros tempos, tempos loucos que não me fazem falta. Só entrava em meu quarto para passar pr’o antigo computador o que eu rascunhava pela rua, pelos bares, pelas bibliotecas. Foram tempos outros. Acho que setenta por cento do que li e escrevi no meu pré-projeto foram lapidados ora no meu trabalho como auxiliar de serviços gerais, ora na rua ou nas praças públicas como o Campo de Santana, por exemplo. Imagem eterna para mim: as cotias do Campo de Santana.
Não me resta muito daquela época. Mas respiro fundo e mergulho na madrugada, um som, alguma fumaça, raramente uma cerveja ou um copo de vinho. Agora mais uma vez quero vencer meu tempo, pois parece que para mim o medo do fracasso não existe, talvez, somente o medo do não tentar. Filosofia forte, eu sei. Uma coisa meio Rocky Balboa. Socos e mais socos e o não saber a hora de jogar a toalha. Mas segundo Marcus, isso faz parte da minha trajetória, talvez, o não ter nada a perder. Mas eis que, por conselho dele, é hora de perder um pouco a ingenuidade e saber a hora de se defender, de recuar, de escolher os caminhos mais seguros para um dia consolidar uma carreira. Talvez quando ele me fez sonhar meu sonho visse isso e me preparasse para isso.
Depositei cada ficha que tinha na possível aprovação na seleção do mestrado. Deixei um mundo cômodo para trás. Refiz-me e desfiz vários planos que não eram meus. Dei um salto sem medir a profundidade do precipício que estava bem abaixo. Tenho certeza de que tinha mais inimigos que amigos torcendo por mim. E quando vi meu nome na lista dos aprovados liguei para meus pais. Liguei para Marcus. Abracei minha (agora oficialmente) orientadora. Liguei para mim mesmo e me disse: consegui. E agora, com a distância que mais uma vez o tempo me traz daquele período, me lanço num novo caminho.


Não que minha vida esteja nos cinco capítulos que estou preste a concluir ou nas inúmeras discussões que surgirão com meus pais. Mas tenho um objetivo. Não é de hoje, tampouco de ontem esse objetivo. Ele faz parte de um caminho que tracei há muito e ninguém depende de mim ou do meu sonho. Sou apenas eu e um circulo pequeno de torcedores, dessa vez não pelo meu fracasso, mas pelo meu sucesso.
Não que eu ache que meus pais não torçam por mim, não acreditem em minha capacidade, talvez, apenas não entendam a profundidade que isso tenha para minha vida e não só profissional, mas como ser humano. Pois aprendi a ver na História minha fuga para os devaneios da vida.
Não tenho nenhuma semelhança com o personagem Monty Kessler, do ótimo filme With Honors. Eu sei que minha dissertação não é minha vida, mas nesse momento seu fim é um possível passaporte para uma nova...