quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Quando uma cidade entra nos traços do seu verso...


Uma chuva fina molha a madrugada em Aracaju. Abro as janelas da sala vazia e deixo que o vento fresco venha carregado como suor. Meu rosto se banha com gotículas de lágrimas do céu. Deu no jornal da tarde que poderia chover na capital.
Em minhas mãos a taça trêmula de vinho e só o som da minha respiração. Alguns carros passam de algum lugar que nem sei – pois eu não sei de nada nem de lugar. A companheira da noite se esvaziou. Pois no tudo o tudo é vazio – meu vinho se foi. A garrafa no canto, mas uma rolha para colecionar, minha assinatura, data e mensagem: Eu estava só no meu lar. Ensaio pegar minha flauta, o prédio alto não permite, não é hora para sons, mesmo que soprados como conversa ao pé do ouvido (Espere por mim, morena/ Espere que eu chego já/ O amor por você morena/ Faz a saudade aumentar). E eu penso em você. Como eu penso em você. Penso como um gemido. Meu relógio parou, talvez, por não ter sentido. Ou ter sentido que não é possível acelerar mais as horas do que o tempo nos permite. Pois agora o tempo passa lento. Uma hora nos separa. Mil, mil, mil e não sei quantos mil’s estão entre mim e você. Juntinhos.
Não há som, só há silêncio. Um pequeno silêncio que me possibilita me ouvir gracejando minhas palavras, eu mesmo me dizendo o que te digo agora: tudo. Tudo é aliteração. Metáforas sobre um tempo bom. Metonímias para o sol. O aroma do chileno que escolhi calmamente no mercado, a taça que guarda um borrão. Taça única que guarda um borrão no meu coração. Me valeu cada palavra de centavos o vinho que me derrama depois no chão.
Já não volto mais, pois se em meu verso incorporei você, pequena cidade puritana, significa que já estou deixando de lado o tesão pela grande meretriz. A preta me pergunta por telefone se serei eu feliz.
Ó Copacabana iluminada, o vai e vem da Atlântica e as putinhas na calçada. Ó Lapa flamejante com samba e noite enluarada! Madureira e Cascadura: eis meu fim! Temam por mim. Não há como gritar Abracadabra! Nova Iguaçu só em música de Chico Buarque na calçada que eu canto indo comprar água. Bem distante como o Cristo e revoada. A Mesquita já não ora mais por mim.
Aos meus pés a Adélia Franco invadindo os meus versos, ao longe o viaduto mudando as cores a cada hora, azul, vermelho, outra cor incerta. Em plena sexta-feira o teatro não se ilumina. Ó Tobias, não é assim que é a vida. Grandes peças: a vida é um stand up comedy? Não há bares a serem fechados, os garçons não nos expulsam dos botecos mal amados. Quero me entornar pela rua. Não há samba quarta-feira, nem Centro Cultural lotado, mas entraste em minha vida devagar e com recalque: um certo caldo. Não tiraste minha roupa, mas embala em sono denso, te vejo dormir e acordar, pois teu ritmo é lento. Mas tua tranqüilidade me é agonia, mas me conquista com jeito de menina querendo um primeiro beijo no colégio. Um primeiro amor sério. Parece que me pede madrugada, meu riso alto na rua, meu x se enroscando com teu ti, fiquemos cada um na sua – questão de bom senso. Pois se saio a noite te assusto esvaziando todas as garrafas da lua.
Preta não há chope da Devassa, o da Brahma, quando tem, é mal tirado. Nos resta a caipirinha num bar bem afastado. Não aceita cartão de crédito, débito nem cheque da mesma praça, mas é na beira do mangue e serve Germana no ponto, dosada com açúcar e limão, do jeito que você gosta. Me pergunta se estou triste? Ou meio magoado? Não... Nada! Isso é poema e, talvez, foi o chileno que acabou e me deixou mal humorado!

Um comentário:

Aquino Neto disse...

ah esses nossos amigos chilenos que se vão antes da festa acabar...
=)